quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Parar, acalmar e curar-se


Existe uma estória zen sobre um homem a cavalo. O cavalo está galopando rapidamente, e parece que o homem que cavalga se dirige a algum lugar importante. Outro homem, em pé ao lado da estrada, grita: Aonde você está indo? E o homem a cavalo responde: Não sei, pergunte ao cavalo!
Esta é a nossa história. Estamos todos sobre um cavalo, não sabemos aonde vamos e não conseguimos parar. O cavalo é a força de nossos hábitos que nos puxa, e somos impotentes diante dela.
Estamos sempre correndo, e isto já se tornou um hábito.
Estamos acostumados a lutar o tempo todo, até mesmo durante o sono.
Estamos em guerra com nós mesmos e é fácil declarar guerra aos outros também.
Precisamos aprender a arte de parar nosso pensamento, a força dos nossos hábitos, nossa desatenção, bem como as emoções intensas que nos regem. Quando uma emoção nos assola, ela se assemelha a uma tempestade, que leva consigo a nossa paz.
Nós ligamos a TV e depois desligamos, pegamos um livro e depois o deixamos de lado. O que podemos fazer para interromper este estado de agitação? Como podemos fazer cessar o medo, o desespero, a raiva e os desejos?
É simples. Podemos fazer isso através da prática da respiração consciente, do caminhar consciente, do sorriso consciente, da oração e da contemplação.
Quando prestamos atenção e entramos em contato com o momento presente, os frutos que colhemos são a compreensão, a aceitação, o amor e o desejo de aliviar o sofrimento e fazer brotar a alegria.
Mas a força do hábito costuma ser mais forte do que a nossa vontade. Dizemos e fazemos coisas que não queremos e depois nos arrependemos. Causamos sofrimento a nós mesmos e aos outros, e de forma geral produzimos grande quantidade de destruição. Podemos ter a firme intenção de nunca mais fazer isso, mas sempre acabamos fazendo de novo. Por quê?
Porque a foça do hábito acaba vencendo e nos levando de roldão.
Precisamos da energia da atenção plena para perceber quando o hábito nos arrasta, e fazer cessar esse comportamento destrutivo. Com atenção plena, temos a capacidade de reconhecer a força do hábito a cada vez que ela se manifesta.
- Alô força do hábito, eu sei que você está aí!
Nessa altura, se conseguirmos sorrir, o hábito perderá grande parte de sua força. A atenção plena é a energia que nos permite reconhecer a força do hábito e impedi-la de nos dominar.
Por outro lado, o esquecimento ou a negligência é o oposto. Tomamos uma xícara de café sem querer perceber o que estamos fazendo. Sentamo-nos com a pessoa que amamos, mas não percebemos que a pessoa está ali.
Andamos sem realmente estar andando. Estamos sempre em outro lugar, pensando no futuro ou no passado. O cavalo de nossos hábitos nos conduz, e somos prisioneiros dele.
Precisamos deter este cavalo e resgatar nossa liberdade. Precisamos irradiar a luz da atenção plena em tudo que fizemos, para que a nossa escuridão do esquecimento desapareça. Precisamos aprender a orar.
A primeira função da oração é fazer parar; a segunda é acalmar,
Precisamos aprender a arte de respirar, de inspirar e expirar, parando tudo o que estamos fazendo e acalmando nossas emoções. Precisamos aprender a nos tornarmos mais estáveis e firmes, como se fôssemos um carvalho e não nos deixar arrastar pela tempestade de um lado para outro.
O ato de se acalmar produz o repouso, e o descanso é um pré-requisito para a cura. Quando os animais selvagens estão feridos, eles procuram um lugar escondido para se deitar e descansam completamente por muitos dias. Não pensam em comida nem em mais nada. Apenas descansam, e com isso obtêm a cura de que precisam.
Quando nós seres humanos ficamos doentes, nos preocupamos o tempo todo. Procuramos médicos e remédios, mas não paramos. Mesmo quando vamos para a praia ou para as montanhas com a intenção de descansar não chegamos realmente a repousar, e voltamos mais cansados do que partimos.
Temos que aprender a repousar, a posição deitada não é a única posição de descanso que existe. Podemos descansar muito bem durante as orações sentados ou caminhando.
Orar ou meditar não deve ser um trabalho árduo. Simplesmente permita que seu corpo e sua mente descansem, como o animal no mato. Não lute. Não há necessidade de fazer nada nem realizar nada.
Parar, acalmar-se e descansar são pré-requisitos para a cura. Se não conseguirmos parar, nosso ritmo de destruição simplesmente vai prosseguir.
O mundo precisa imensamente de cura, Os indivíduos, comunidades e países estão cada vez mais necessitados de cura.

Thich Nhat Hanh em “A essência dos ensinamentos de Buda”

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