quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Sobre a Finitude

Com a revolução industrial, passou a predominar a crença  de que uma qualidade de vida superior resulta  de melhores condições materiais, acumuladas no decorrer da vida.
Passou-se a enaltecer valores como conforto, vida regrada , casamento feliz, trabalho que renda bens materiais, com o prestígio daí resultante. 
Esqueceu-se  de que esses valores, ainda que desejáveis, são sempre exteriores, podem exigir  muitos anos  de empenho, e nem sempre  são obtidos por meios lícitos. Acarretam uma preocupação exagerada com o status quo, deixando de lado a vida interior.
Infelizmente, essa  perda só é percebida quando o indivíduo se dá conta do que deixou passar, por não ter cultivado a sua espiritualidade, ocupando o seu cérebro com ideias de como ganhar mais dinheiro. Nesse período, em que ficou mergulhado no mundo exterior, provavelmente, já adquiriu alguma doença incapacitante.
Viver bem não é só continuar existindo e o sentido da vida não é só sobrevivência, mesmo que seja nas melhores condições materiais.
O caminho para  desenvolver  um estilo de vida  saudável consiste em manter a alegria de viver, criar coisas novas, conviver bem com as pessoas próximas, com a natureza e com o Universo. Esse estilo de vida vai determinar  um envelhecer bem sucedido e não deve ser confundido com o cultivo do prazer dos sentidos.
Cuidar de si é uma arte, um privilégio, com autonomia  para não se sujeitar  às conveniências do lazer exterior.
Quando o indivíduo se dá conta da finitude, pelas próprias  limitações da existência, deve contentar-se com as suas realizações, sem reter amarguras e frustrações, bem como raiva e inveja, sentimentos prenunciadores de doenças.
Como ensinam as ciências da vida e da saúde e a reflexão filosófica e religiosa, mas também e - sobretudo a própria experiência cotidiana - morte, finitude e vulnerabilidade são características intrínsecas dos sistemas vivos, os quais são sistemas jogados no mundo e situados no tempo, submetidos a um processo irreversível que inclui o nascer, o crescer, o decair e o morrer.
Trata-se de um fato incontestável perante nossos sentidos: todos os seres vivos, inclusive os humanos, morrem. Morrem porque estão vivos, porque como sistemas irreversíveis são programados biologicamente para morrer e, talvez, devam morrer para que outros seres da mesma espécie possam vir a ser.
Por isso, não podemos ter certezas acerca das crenças sobre nossa morte. De fato, a ciência teve poucas certezas ao longo de sua breve história, sendo que hoje ela não tem mais nenhuma.
Sendo assim, vida e morte devem ser consideradas como as duas faces inseparáveis da existência humana, durante a qual são mediadas pelas situações de finitude chamadas vulnerabilidade.
Por isso, para Sêneca, um dos homens mais poderosos de Roma, viver é aprender a morrer. 

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